PANDEMIA: doença do refluxo pode estar associada a agravamento de casos de Covid-19

Pesquisadores da USP e da Universidade de Campinas avaliam que distúrbios digestivos podem estar associados a um risco maior de morte pelo novo coronavírus. Especialistas em doenças gastrointestinais afirmam que, mesmo sem revisão científica, pesquisa é contribuição importante 

Mesmo com o surgimento de uma vacina contra a doença responsável pela maior pandemia do século 21, com 1,8 milhão de mortes e a infecção de mais de 80 milhões de pessoas mudo afora, a Covid-19 ainda continua desafiando a rotina de médicos e pesquisadores da área de saúde em relação a seu agravamento associado a outras patologias.

Um estudo recente, ainda sem revisão pela comunidade científica, mas que foi desenvolvido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB-Unicamp), sugere que distúrbios digestivos como o refluxo gastroesofágico e a síndrome de Barrett podem estar associados a um risco aumentado de morte por Covid-19. A pesquisa contou com o apoio da Fundação de Ampara à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). 

Stomach pain, food poisoning or digestion problem after fast junk food. Man ate too much and is holding belly with hand. Indigestion, heart burn or unhealthy diet.


“Nossos dados sugerem que a alteração no pH do tecido esofágico poderia favorecer um aumento da carga viral nesses pacientes”, disse à Agência FAPESP Helder Nakaya, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP) e coordenador da investigação. Médicos especializados no tratamento de doenças do sistema gastrointestinal afirmam que, embora o estudo ainda não tenha sido revisado, não deixa de ser uma importante contribuição para descoberta de novas comorbidades associadas ao agravamento da Covid-19.

Sintomas gastrointestinais
De acordo com o cirurgião do aparelho digestivo, especialista em endoscopia digestiva e professor da Faculdade de Medicina do ABC, em São Paulo, Eduardo Grecco, o estudo em questão tem total coerência, pois, segundo ele, demonstra as marcação dos receptores da angiotensina, o ACE2 – gene responsável pela entrada do novo coronavírus na célula. Ele lembra que há outras pesquisas no mundo que apontam para esse mesmo tipo de comorbidade em relação ao Covid-19. 

“Temos registros de muitos pacientes com coronavírus que iniciam com sintomas gastrointestinais. E se a pessoa possui refluxo, ela terá um processo inflamatório ali no esófogo, com isso esta pessoa terá em seu organismo uma presença maior dessa enzima (ACE2), que irá facilitar a entrada do vírus”, destaca o médico. 

Para o médico Flávio Heuta Ivano, que é membro titular da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED), do Colégio Brasileior de Cirurgia  Digestiva e professor da Escola de Medicina da PUC Paraná, o estudo desenvolvido pela USP e pelo IB-Unicamp é mais uma contribuição importante para tentar sanar um enorme conjunto de dúvidas e desafios ainda trazidos pelo novo coronavírus. “A Covid-19 é uma doença muito nova e não sabemos ainda muito qual é a sua fisiopatologia, por isso todo estudo é válido. Se houver comprovação desta associação [ao refluxo], será mais uma comorbidade que pode complicar a Covid-19, assim como já se demonstrou em relação à obesidade, à diabetes, hipertensão e cardiopatias crônicas”, destaca o especialista.

Contribuição  médica
O gastroenterologista e membro titular da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva, Hugo Gonçalo Guedes, lembra que muitos desses estudos científicos sobre a Covid-19 são frutos de constatações e levantamentos feitos pelos profissionais médicos  que estão na linha de frente do combate à pandemia. 

“No caso da Covid-19, as hipóteses estão surgindo após análises retrospectivas de associação. Pega-se uma turma de pacientes que teve a doença, documenta todos os detalhes da evolução da patologia em prontuário e tenta associar com o desfecho. Em pacientes que tiveram um determinado desfecho, avalia-se qual a característica ou características eles têm em comum. Com isso levanta-se uma hipótese que, obviamente, deverá ser provada estatisticamente e cientificamente. E assim nós médicos contribuímos para esses estudos que a cada dia descobrem novidades sobre essa nova doença”, explica o médico.

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