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A operação da Polícia Federal sobre o plano da facção criminosa PCC contra o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) dividiu o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Enquanto Lula e alguns assessores próximos acirraram a disputa com opositores ao sugerir, sem provas, uma “armação” de Moro no caso, outros aliados lamentaram a declaração do presidente e iniciaram uma operação para tentar corrigir o discurso oficial.
Horas após a declaração do petista, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) publicou vídeo em redes sociais fazendo questão de elogiar a ação da PF e do Ministério Público “por esse importante trabalho” e dizendo que a facção PCC tinha “graves planos contra a democracia brasileira”.
Nos últimos dois dias, a falta de um discurso unificado do Planalto para reagir à notícia de que a facção criminosa planejava ataques contra Moro e outras autoridades ficou evidente. Os desencontros começaram antes mesmo da deflagração da operação Sequaz pela Polícia Federal na quarta-feira (22).
Na última terça (21), Lula citou o ex-juiz em uma entrevista ao site Brasil 247. Ele disse que, durante sua permanência na carceragem da PF em Curitiba, dizia a visitantes que só ficaria bem quando conseguisse “foder esse Moro”.
Os planos do PCC vieram a público no dia seguinte, com o início da operação. Opositores imediatamente atuaram para atrelar a fala de Lula da véspera ao esquema criminoso, ao passo que aliados do Planalto tentaram transformar o ocorrido numa pauta positiva.
O objetivo era usar o episódio para destacar que a PF é um órgão de Estado que, no governo petista, trabalha para proteger inclusive um dos principais adversários do presidente da República.
Nessa linha, o ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), rebateu bolsonaristas e disse que a investigação é prova de que a corporação policial defende “a vida e a integridade de um senador e oposição ao nosso governo”.
Mas enquanto Dino tentava transformar a operação em evidência de republicanismo do atual governo, partes do entorno de Lula alardeavam dúvidas em reuniões privadas sobre o caso.
Integrantes do Planalto apontavam haver coincidência demais no fato de a operação ter sido deflagrada um dia após o uso, por Lula, da expressão “foder esse Moro”; e que a juíza responsável pelo caso era Gabriela Hardt, que substituiu o próprio Moro nos processos relacionados à Lava Jato.
A versão alardeada por palacianos chegou a Dino e à PF, causando desconforto. O incômodo ocorreu porque toda a investigação foi feita durante o governo Lula, na gestão de Andrei Rodrigues como diretor-geral da corporação.
A PF está sob a alçada do Ministério da Justiça, razão pela qual o titular da pasta ficou especialmente contrariado com as sugestões de um possível conluio contra Lula feitas por alguns interlocutores petistas.
Com as explicações dadas por representantes da PF e da Justiça, houve uma tentativa de ajuste no discurso. Palacianos passaram a ponderar que a investigação havia sido conduzida de maneira séria.
A correção de rumo parecia ter sido alcançada na manhã desta quinta (23).
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), se manifestou pela manhã e afirmou que a operação da PF era uma retratação à fala de Lula e mostrava como a corporação sob o governo petista “protege a vida de todas as autoridades, não só do ex-juiz, do senador, mas de todas as autoridades que possam ser ameaçadas”.
No entanto, ao comentar o caso em uma agenda no Rio de Janeiro, o presidente ignorou conselhos de aliados e levantou a ilação de que o caso seria uma “armação do Moro”.
“Eu não vou falar porque acho que é mais uma armação do Moro. Quero ser cauteloso, vou descobrir o que aconteceu. É visível que é uma armação do Moro”, disse Lula.
Pouco depois dessa declaração, Gabriela Hardt autorizou a divulgação das decisões e pedidos da Polícia Federal relacionados ao caso.
O material apontou que o plano do PCC contra a integridade física de Moro era iminente e que o grupo criminoso monitorou locais que o ex-juiz frequentava, inclusive o clube em Curitiba onde ele votou na eleição de 2022.
Moro reagiu e cobrou “decência” do presidente. “Senhor presidente Lula, o senhor que dá risada da ameaça a um senador e a sua família pelo crime organizado, eu lhe pergunto, o senhor não tem decência?”, questionou.
O comentário de Lula sobre uma possível “armação” e os ataques de opositores selaram a avaliação no governo de que o balanço do episódio é negativo para o Palácio do Planalto. O diagnóstico é que o pronunciamento do mandatário foi feito sem a ponderação necessária e ajudou a dar ainda mais holofotes para Moro.
Moro vinha de uma sequência de derrotas políticas desde que deixou a magistratura. Saiu do governo Jair Bolsonaro (PL) rompido com o ex-mandatário e foi considerado parcial na condução da Lava Jato.
Ensaiou uma candidatura à Presidência, mas acabou se lançando ao Senado pelo Paraná. Até o momento, vinha com uma atuação discreta no Congresso.
Agora, conseguiu antagonizar com Lula e voltou ao noticiário. De quebra, viu o presidente ser constrangido com os dados da investigação da PF que contrariam a tese de uma “armação” do senador.
Assessores diretos do petista devem abordar o tema em conversa nesta sexta-feira (24). A expectativa é que isso seja tratado em uma audiência com Dino, Padilha e os ministros Jorge Messias (Advocacia-Geral da União), Vinicius Carvalho (Controladoria-Geral da União), Rui Costa (Casa Civil), e Paulo Pimenta (Comunicação Social).
Pimenta foi um dos aliados que tentaram minimizar a fala de Lula. “Na minha opinião, a fala do presidente em nenhum momento questiona a investigação, até porque [ela] foi conduzida pela PF e pelo Ministério da Justiça. Mas acho que o objeto do questionamento foi o conjunto de coincidências, fatos que acabam trazendo de volta toda uma memória sobre o método que foi utilizado contra ele [na Lava Jato], muitas vezes [com os] mesmos personagens”, disse o ministro no fim da tarde desta quinta.
“Muito mais do que como presidente, como ser humano, é natural o sentimento de dúvida, indignação dele [Lula]”, completou.