A Petrobras anunciou na semana passada uma nova redução no preço da gasolina vendida às distribuidoras. O valor do litro do combustível nas refinarias passa de R$ 3,53 para R$ 3,28 por litro, uma redução de 7,08%. A última alteração no preço da gasolina havia sido em 16 de agosto.
Na comparação com outros países, o preço da gasolina no Brasil foi um dos que mais caiu nos últimos meses, segundo dados da Global Petrol Prices, que pesquisa os valores em 168 nações, a maioria delas semanalmente.
A reportagem comparou os rankings elaborados pela consultoria em 27 de junho e 29 de agosto deste ano.
Nesse intervalo, o Brasil subiu 37 posições, da 76ª gasolina mais barata para a 39ª, e ficou entre os dez países onde o preço do litro do combustível mais baixou.
Entre os países em que o valor caiu mais do que no Brasil estão Turquia, Panamá, Vietnã, Austrália, Honduras, Montenegro e Gana.
Mas afinal, por que os preços estão baixando tanto no Brasil e quem paga a conta pela queda?
Por que os preços estão caindo?
Pedro Rodrigues, sócio-diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), explica que as variáveis que influenciam de forma mais robusta o preço da gasolina são o preço do barril de petróleo no mercado internacional e a taxa de câmbio, já que a commoditie é cotada em dólares.
São esses os principais fatores que incidem atualmente sobre o valor no Brasil e que fizeram com que a Petrobras anunciasse uma nova redução.
“Neste momento, o preço do petróleo e o câmbio estão cedendo. E na Petrobras ou qualquer empresa que segue o mercado internacional, quando baixa o preço do barril cai também o preço do combustível”, diz.
Na última terça-feira (30/08), os preços do petróleo caíram quase US$ 6 dólares por barril, o declínio mais acentuado em cerca de um mês.
Em nota, a Petrobras informou que a redução do preço da gasolina nas refinarias acompanha essa tendência.
“Essa redução acompanha a evolução dos preços de referência e é coerente com a prática de preços da Petrobras, que busca o equilíbrio dos seus preços com o mercado, mas sem o repasse para os preços internos da volatilidade conjuntural das cotações internacionais e da taxa de câmbio”, disse a estatal.
Mas além dos preços no mercado internacional, existem outros fatores que podem influenciar o preço dos combustíveis, ainda que de maneira mais sutil.
Segundo Rodrigues, vale citar os tributos – tais como PIS/Cofins e ICM – e o percentual de mistura do etanol na gasolina.
É justamente a política tributária do governo brasileiro, somada ao real em valorização frente ao dólar, que está fazendo com que o preço caia mais no Brasil do que em outros países.
“Além de ter a queda no preço global do petróleo, o Brasil aplicou uma política que reduziu ainda mais a alíquota tributária, reduzindo também o preço final dos combustíveis. Por isso que, em termos percentuais, o preço por aqui caiu mais que em outros países”, explica o sócio-diretor do CBIE.
A própria Global Petrol Prices explica que as diferenças entre os valores do litro da gasolina nas diferentes nações em seu ranking devem-se a vários tipos de impostos e subsídios para o combustível.
O que mudou na política tributária?
No final de junho, entrou em vigor no Brasil a legislação que limita as alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Produtos (ICMS) que incidem sobre itens considerados essenciais – como combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo.
Sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) após longas discussões e uma tramitação demorada no Congresso, a proposta determina que estados limitem a cobrança do tributo, que é estadual, à alíquota mínima de cada estado, que varia entre 17% e 18%.
Ao mesmo tempo, o governo também zerou as alíquotas da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) – dois tributos federais – para os combustíveis.
Em março, um decreto e uma medida provisória já haviam zerado as mesmas alíquotas sobre a comercialização e a importação do óleo diesel e do gás de cozinha.
De acordo com o analista da Instituição Fiscal Independente (IFI), Alexandre Andrade, do ponto de vista de tributação, esses foram os eventos que mais impactaram o preço dos combustíveis quando entraram em vigor.
“Todos os estados cobravam alíquotas de ICMS superiores a 17% ou 18%. Alguns estados, como o Rio de Janeiro, cobravam até mais de 30%”, diz o economista.
“O decreto que zerou as alíquotas do PIS e Cofins também teve impacto, mas o ICMS definitivamente pesou mais no preço dos combustíveis.”
De onde sai o dinheiro dos tributos?
Andrade explica que o ICMS é o principal tributo de competência dos estados, além de sua maior fonte de receita.
“Em particular, os itens que foram objeto da lei que reduziu a alíquota do imposto, ou seja, combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo, são os principais setores de arrecadação dentro do ICMS”, diz.
“Isso significa que a redução da alíquota do ICMS impõe uma perda de arrecadação significativa para os estados.”
O ICMS arrecadado, por sua vez, contribui para serviços essenciais financiados pelos governos estaduais, tais como educação, saúde, segurança e o custeio da máquina pública.
No final de maio, a XP estimava uma perda na casa de R$ 103 bilhões em receita para os governos estaduais por seis meses de 2022. Já no cálculo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), a perda apenas dos municípios é de R$ 22 bilhões.
Pela lei, o governo federal é obrigado a compensar os Estados quando a perda de receita com o tributo ultrapassar o porcentual de 5%, na comparação com a receita registrada no ano anterior.
Anteriormente, o governo havia entendido que o Congresso determinou que a comparação deve ser feita com base nas receitas de todo o ano. Com isso, a compensação, se necessária, só ocorreria em 2023.
Recentemente, porém, o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu liminares a sete estados (São Paulo, Alagoas, Maranhão, Piauí, Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Acre) para a compensação imediata das perdas por parte da União.
Por outro lado, PIS, Pasep e Cofins são contribuições sociais no âmbito de competência da União, que têm como destino o financiamento da seguridade social.
“O PIS e Pasep financiam, por exemplo, a política do abono salarial e o seguro desemprego. Já o Cofins é uma contribuição que serve para financiamento da seguridade social, ou seja, da Previdência”, explica o economista da IFI.
Segundo Alexandre Andrade, o governo federal praticou essas exonerações porque a arrecadação está crescendo a um ritmo forte, apesar de já ter iniciado um processo de desaceleração mais recentemente.
“Quando o governo abre mão de uma arrecadação, a Receita Federal classifica tecnicamente como gastos tributários. É como se, ao abrir de uma arrecadação, o governo estivesse realizando uma política pública”, diz. “No caso dos combustíveis, o governo está concedendo um subsídio para quem consome gasolina, etanol, diesel e gás de cozinha.”
Mas há quem critique a medida.
“A principal crítica feita por alguns é de que o governo está financiando o consumo de combustíveis fósseis, em um contexto em que o mundo todo está discutindo medidas para reduzi-lo”, afirma o economista da IFI.
“E, de forma geral, o governo poderia estar destinando esse recurso para outras áreas.”
Uma estimativa do IFI de março calculava uma renúncia de cerca de R$ 17,6 bilhões em arrecadação com a suspensão das alíquotas do PIS, Pasep e Cofins do óleo diesel e do gás de cozinha até o final do ano.
Já com a medida que zerou as mesmas alíquotas que incidiam sobre a gasolina e o etanol em junho, a instituição estimou uma perda na casa dos R$ 18 bilhões até dezembro. Somados, os dois valores totalizam R$ 35,6 bilhões.
Mas em sua proposta para o orçamento de 2023, encaminhada na quarta-feira (31/8) ao Congresso Nacional, o governo indicou sua intenção de prolongar a redução das alíquotas sobre a gasolina, o etanol e o gás natural veicular (GNV).
Com essa medida, o próprio governo estimou uma perda de R$ 34,3 bilhões em arrecadação.